Palavras do Criador

O Horror Show surgiu de modo a me ajudar expressar minhas ideias. Gosto quando as pessoas escutam minhas narrativas, quando se sentam nas mesas de RPG para fazerem parte da história, então muito do que escrevo aqui fez ou fará parte de alguma crônica, sessão ou enredo ou as veses as história não podem ir para a mesa e acabam indo pro Blog. Então para aqueles que gostam de Histórias de Horror, sintam-se a vontade!!!

sexta-feira, 24 de julho de 2009

O Misterioso Doutor Black. Parte Final

IV

Acordei na manhã seguinte com o choro da minha mãe ao telefone. “Mas como isso foi acontecer? Ele era um garoto tão calmo.” ela indagava incrédula. “Vou avisar o meu filho.” Me avisar? Sobre o que? Questionava-me. Seria algo grave ou cometi algum deslize, ela descobrira do nosso segredo? Carlos, ele contou, só podia ser.

Enquanto perdia-me em pensamentos dramáticos um grande choque me irrompeu. “Carlos está morto meu filho. Sinto muito” nada falei naquela hora e pelo resto da semana. Carlos era um irmão para todas as ocasiões, não podia ser não ele. No mesmo instante um nome me veio à mente: Black. Só podia ser ele sabia que Carlos revelaria seu segredo por isso achou melhor silenciá-lo. Mas as autoridades diziam que foi suicídio, enforcou-se em seu quarto. Mentiras. Estavam envolvidos com Black com certeza. A paranóia começava a brotar em minha cabeça como uma semente de girassol que mal precisa de água, apenas nasce. Porem não morreria como um girassol. Persistiria.

Os dias passados trancado no quarto, sem falar nada arquitetava um plano para descobrir o que aconteceu realmente. Até então havia esquecido Hélio, grande erro meu, deveria procurá-lo logo, saber o que pensava. Este foi meu primeiro passo, encontrar Hélio.

Surpreendi ao encontrar Hélio despedindo-se do doutor na varanda da sua casa. O medico estava lá para fazer uma consulta na dona Carmem, ela passou mal no café da manha e agora estava de cama, provavelmente intoxicação alimentar. Não podia se confiar naqueles malditos enlatados. Pensava sobre isso sem desviar meu objetivo. A paranóia crescera. Começava a acreditar que aquilo não foi uma intoxicação qualquer e sim obra do abominável medico. Desespero. Ele poderia estar chantageando Hélio, usando sua mãe para fazer o rapaz calar-se. Afinal passou-se sete dias sem que eu tivesse contato algum com Hélio. Ele já poderia estar corrompido.

- Rapaz você ta sumido. Ta mais magro. Tava doente?

- Pensando sobre o que aconteceu com Carlos.

- Hum.

-Acredita mesmo que ele se matou? Acho isso muito estranho. Conhecíamos bem ele, sabia que nunca faria uma coisa destas. Tem alguma coisa errada, a policia ta escondendo algo.

-Mas agente não pode fazer nada. É melhor deixar assim.

Prestei mais atenção ao até então amigo quando ele finalizou esta frase “... deixar assim.” Percebi que escondia algo de mim, minhas teorias começavam a se formar corretas, Hélio encobria o doutor assassino. Só faltava descobrir o por que.

-Mas você falou que sua mãe ta doente... Deixa-me dar um alô pra ela. – insisti em tentar ver a dona Carmem. Deveria haver alguma coisa de errado.

Entrei sem esperar permissão. Percebi que ele estava confuso e tentava me impedir quando pus o primeiro pé depois da porta de entrada. Andando rápido dirigi-me logo ao quarto da dona Carmem. A velha senhora dormia em seu leito, o lençol grosso feito a mão por ela mesma cobria seu corpo expondo apenas a cabeça e as mãos, que descansavam próximo ao rosto. Parecia um sono tranqüilo. Trouxe para perto da cama uma cadeira e sentei-me. Alivio. Aquela senhora que por tanto tempo cuidou de mim quando na época em que meus pais não tinham condição estava agora descansando numa paz profunda. Profunda de mais.

Hélio parou em frente à porta do quarto, olhava fixamente para mim, retribui o olhar como um cachorro de olhos baixos que pede desculpas ao dono por ter feito tanta besteira. Despejara um sorriso sem graça do canto da minha boca. Estava ficando realmente paranóico. Um frio agonizante percorreu-me a espinha quando ele sorriu de volta, mas este não foi o motivo real para tanta angústia.

A mão do velho apertava a minha com uma força descomunal. Estava fria, muito fria. Virei o rosto lentamente em direção ao leito da mulher. Seus olhos estavam avermelhados e esbugalhados, olheiras profundas. O frio. Sua voz tremula rouca e vacilante “Não confie neles”. Um gosto ruim de ácido gástrico incidiu em minha boca. Um golpe na nuca. Dor. Perda de sentidos.

V

Zumbido. Incomodo nos ouvidos. Mosquitos, insetos. O suor escorria quente pela testa, nariz até chegar a boca, ruim e salgado. Acordei. Escuridão total. Mal podia mexer os braços ou as pernas, estava acorrentado em uma cadeira. Sentia o mau cheiro de carniça vindo do lado de fora, trazido até minhas mucosas por sutil corrente de ar. Carniça. O farfalhar das asas do lado de fora me fazia pensar que lugar era aquele. Carniça, pássaros, escuridão total. Raciocinei matematicamente em cima dos meus sentidos durante muito tempo para em fim chegar a uma conclusão duvidosa. O lixão.

O que eu não havia dito antes é que a Villa é um distrito costeiro e estende-se para mais de dez ilhas espalhadas pelo rio Cócito. Uma deles servira de lixão para o distrito, onde toda semana uma embarcação despeja toneladas de lixo vindo de muitas regiões de Helm.

Ouvi um ranger de trancas metálicas, a porta estava se abrindo. Um feixe de luz iluminou vagamente a sala onde eu estava preso. O doutor adentrava, A vaga luminosidade fora tapada Poe aquele homem de jaleco e luvas brancas. Logo atrás vinha Hélio, usava as mesmas roupas daquela manhã e, igual ao doutor, uma mascara higiênica. Não havia percebido ainda, mas Hélio empurrava uma mesinha metálica com rodinhas, o som era sutil, mas ainda sim incomodava, percebi verdadeiramente do que se tratava ao ver os instrumentos cirúrgicos estacionados ao meu lado naquela mesa metalina. A sensação de pavor me alcançou novamente, o mau cheiro, o ruído sutil das rodinhas e o gosto acre na boca personalizavam meu medo. Seria meu fim.

- Apensa não se mexa. Sentir-se-á melhor quando terminar. – Mal podia escutar a voz do doutor, a máscara transformava sua voz para um grunhido horripilante.

- O que... Que... Vai fazer? Vai embora! Deixa-me em paz! Juro que não falo nada! Seu segredo está guardado comigo. – Gritava e esperneava. Tudo em vão.

Minha voz sufocou ao sentir o bisturi abrir minha carne, era suave, não era dor. O liquido escarlate quente escorria pela testa. Ele estava abrindo minha cabeça. Desta vez me abordou uma impressão de dor, Helio traspassava uma agulha em meu braço. A dor não durou muito, em poucos segundos não sentia mais coisa alguma. Entretanto via a carnificina do doutor Black contra meu corpo dormente. Seu bisturi e outros instrumentos cirúrgicos que desconheço dançavam na carne semimorta da minha consciência viva. Apensa movia os olhos e para onde o levava enxergava apenas sangue e vísceras.

Meu abdômen estava aberto em abas, seguradas por pregas metálicas a altura do peito. Um corpo estranho remexia meu estomago na parte de dentro, era a mão e o braço do lunático doutor Black. Enquanto sua mão direita conhecia minhas entranhas, a segunda manuseava um grande frasco com liquido transparente. Um a um meus órgãos foram retirados do interior e depostos naquele frasco. Perdi a consciência mais uma vez. Seria a ultima. Estava morto agora.

VI

Acordei assustado. Meus olhos doíam uma luz forte me ofuscava a vista. Com os olhos espremidos e lacrimejantes arrisquei buscar um mínimo espectro que fosse. Era um quarto de hospital; “Salvo!” pensava. Quem havia me arrancado daquele pesadelo pouco importava. Sai vivo daquele inferno. Tentei levantar da cama, mas os tendões e músculos repuxavam minha pele, cada junta, articulação e miado de órgão do meu sistema corpóreo inteiro baleavam. Não podia nem sequer me por de pé. Entretanto buscava, com o único sentido de que realmente me valia naquela condição, enxergar meu estado. Lembrando da carnificina que aquele demente médico fazia em meu corpo retirava forças para renascer. Amedrontado e vacilante puxei com o resto de energia que restava em meu interior o lençol que cobria meu corpo, um tecido azul e grosso gravado nele uma insígnia e um nome, a altura do meu peito: “Hospital Metropolitano”. Finalmente me via e confirmava minhas hipóteses de vida, uma grande bandagem cobria do meu peito até a região do apêndice, exatamente onde o doutor abrira quando retalhou.

A porta pequena de madeira posta em frente ao leito em que me encontrava rangia enquanto admirava minha cicatriz. Alguém estava entrando. Um leve sorriso surgia em meu rosto ao ver a senhora com roupas brancas e uma bandeja metálica entrando e elogiando-me por já esta acordado tão cedo. “Você parece estar em perfeita saúde” ele me dizia. Disse também mais outras coisas que não me recordo, pois meu estomago reclamava mais alto que a voz daquela simpática enfermeira. Confesso nunca ter desejado tanto um bom prato de comida, mesmo depois de exaustivas horas trabalhando na plantação de cana-de-açúcar que sustava minha família ou dos dias santos em jejum enfornado dentro da igreja da Villa.

A bandeja metálica finalmente descansou sobre minhas pernas. A esta altura me sentia como um lobo prestes a devorar sua presa. Fixei meus olhos na Iris da enfermeira, meu olfato despertou pra um novo cheiro: medo. Estranhamente ouvia o palpitar desesperado do seu coração, suas mãos suavam frias. Ela nunca teria assistido ou aceitado este paciente se soubesse, o homem tomava a forma dos seus medos mais insanos. Fobia. Pavor. Curiosidade, que fim daria aquilo? Acuada. Como uma presa. Eu era seu predador. Surpresei-la ao largar a bandeja e a sopa no lençol azul da cama, do mesmo lugar saltei ferozmente, fitava seu pescoço. Emitia um sinistro brilho no olhar, desejava sua carne.

O grito de dor... Soava como musica... Êxtase...

Gradualmente a mulher perdia suas forças para gritar ou debater, enquanto ingeria sua carne e seu sangue. Recobrei minha consciência neste instante, olhei ao redor de mim e via meu reflexo refletido no liquido escarlate, deformado pelas vísceras arrancadas a força da enfermeira jazida no colo do monstro... Eu. Além do pesar que sentira e da hedionda visão que me acometera outro sentido pulsava em mim, o paladar. Degustava um doentio coquetel de sangue e carne humana, de onde brotava uma energia estonteante e consumidora no interior do meu ser. Na alma. Entretanto entendia que nestas condições alma alguma habitava meu corpo, o diabo a havia levado junto com meus órgãos quando me aprisionou em sua armadilha profana.

VII

Saciado. Ensangüentado. Dei-me conto do monstro que me tornara. O satânico médico não retirou apenas meus órgãos vitais, a sobriedade e arrancado o espírito que margeava esta existência. Ele também me dotou das mesmas capacidades e mistérios horripilantes vivenciados em seu âmago. Tornou-me uma criatura dependente de carne e sangue humano. Detentor do legado amaldiçoado da eterna e insaciável fome. Conspícua. Canibal. Monstro.

Espero ter satisfeito teu ultimo desejo. Confesso que nossa conversa, ou melhor, minha narração foi libertadora. Desde que a fome me acometeu de tal forma a ter de sacrificar meu criador, não compartilho com criatura alguma meu segredo. E agora levarás para a tumba esta história, pois teu corpo e sangue servirão de alimento para sustentar minha amaldiçoada condição.

Conforta-te, pois não serás o ultimo...

segunda-feira, 6 de julho de 2009

O Misteriosos Doutor Black. Parte I

Villa é um distrito da cidade de Helm, afastado da cidade. As pessoas que vêem de fora da região podem até pensar que é um município pequeno, interiorzinho de gente humilde. Aqui todos se conhecem, não há muitas propriedades, porem as extensões de terras são enormes. O bar do Guerra é uma das construções mais humildes do local, porém é sempre agitado nos fins de semana. O distrito possui uma igreja, a da Nossa Senhora das Graças, o povo é bem religioso e um posto policial, costumeiramente freqüentado pelos moleques vagabundos e problemáticos. Pode-se dizer que os únicos crimes que aconteciam na Villa eram de vandalismo. Mas certa vez houve um crime de verdade.

Lembro-me bem. Era uma manhã de sol em julho de 1906 e eu estava cortando lenha para dona Márcia, queria ganhar alguns trocados. O marido dela não estava em casa, ele havia saído na noite passada para jogar dominó no bar do guerra e só iria voltar quando bebesse todo seu dinheiro, era de costume por lá esse jogos. Ao meio-dia eu já havia terminado mais da metade da lenha e estava servindo-me de um prato de comida preparado pela dona Márcia, almoçava do lado de fora e vi quando o senhor Ricardo chegou, ele me cumprimentou e entrou. Estava bêbado ainda.

Escutei o homem falar diversas vezes “Querida venha aqui não vou lhe fazer mal. Eu te amo!” enquanto procurava a mulher. Até então pensei que era apenas mais uma daqueles surtos de gente bêbada que não tem noção do que fala. Entrei na casa para agradecer o almoço e lavar o prato e quando cheguei à cozinha vi sangue e um corpo no chão, era a dona Márcia. Jogada de bruços, uma poça de sangue formava-se sob ela, o marido estava à mesa chorando, limpava uma faca de cortar carne, as mãos sujam de sangue e óleo de cozinha. Fique estático durante um tempo, larguei o prato que segurava no chão e corri, precisava chamar alguém.

Cheguei depois de um tempo com a polícia, mas o que achamos desta vez foram dois corpos, o da mulher e do marido, ele cravou a faca em seu abdômen, suicidou-se. Mais tarde descobrimos o motivo de tudo aquilo, ele apostou sua propriedade em um jogo de dominó e perdeu tudo. Provavelmente não queria ver a mulher mendigando ou usando o corpo para ganhar dinheiro e decidiu por um fim no destino dos dois. Entretanto não é essa a história que nos interessa. Esta era apenas para lhe dizer das coisas estranhas que acontecem aqui.

I

1914 era um ano quente e em julho o local parecia o inferno de tão cáustico que se tornara. A polícia apagou dois incêndios aquele mês, um nas terras do senhor Silva e outro na mata que ser forma antes do rio. Aquilo não era comum de acontecer, os mais velhos chamavam de mal pressagio, eles sabiam o que ia acontecer.

Não recebíamos muitas pessoas de fora da cidade ali naquele distrito. Geralmente nos visitavam o prefeito de Belém ou o delegado geral para verificar se estava tudo em ordem por ali. Então a chegada do viajante nos foi inesperada. Ele chegou pela parte da noite não havia quase ninguém nas poucas ruas do distrito, posso afirmar quem o viu chegar foi poucas pessoas, mas a noticia de sua chegada já estava na boca dos maiores leva-e-traz do distrito, afinal lugar pequeno, todos se conhecem, é difícil não saber. Antes de ver o tal viajante, já sabia como ele era e onde estava hospedado. Homem alto, magro, pálido por carência de sol, cabelos bem negros, escovados, em fim não dava pra saber realmente, afinal não o vira até então.

A antiga casa dos Rodrigues estava alugada, porem o locatário ainda não aparecera. Descobri quem era assim que soube dos boatos. O viajante. A casa parecia ter sido alugada muitos dias antes da chegada do viajante, mas não posso dar certeza, não me lembro de ver a placa de alugado em frente àquele casarão.

II

Os boatos sobre o homem que chegara de viajem há algumas semanas era passado, todos nós já o conhecíamos. O nome dele era Black e era médico. Fora designado pelo estado para exercer sua função ali. O ultimo médico de que me lembro era do doutor Costa, aposentou-se aos sessenta anos e partiu para cidade grande. Diferente do doutor Costa “o carrasco”, como o chamávamos, Black mostrou-se atencioso. Aparecia na casa dos doentes e velhos para saber de sua saúde sem cobrar taxa extra. Nos dias de folga reunia-se com os rapazes da minha idade no bar do guerra para falar de mulheres e coisas de gente nova. Carismático sem duvida.

Em uma destas reuniões, já tarde da noite, estávamos todos bêbados. Secamos para mais de trinta garrafas de cerveja, não era costume beber tanto, mas esta parecia ser uma noite especial... O bar finalizara seu expediente e saímos os quatro, Hélio parecia estar mais embriagado que todos nós juntos. O doutor e Carlos o carregavam. O caminho a pé para casa com aqueles três tornava-se divertido. Cantávamos músicas engraçadas e nos divertíamos muito. Hélio não agüentou tanto quanto nó e vomitou, parecia botar as vísceras para fora. “Ele precisa de um banho. Não vou levá-lo a casa da dona Carmem assim. Ela me mataria!”. Concordamos com o argumento de Carlos. Desviamos o caminho e seguimos em direção ao lago.

Hélio parecia muito exausto. Depois de banhá-lo e limpa-lo deixamos o rapaz encostado no pé de uma goiabeira. Hélio consumira um pouco do nosso tempo e nos cansou. Sentamos todos ali e nos divertimos, ainda sobrara uma garrafa de cerveja que eu vinha trazendo na mão, enquanto conversávamos bebíamos. A conversa tornava-se mais e mais estranha. Black, o doutor, parecia tenso e preocupado, ele escondia algo. Um segredo. Não se conteve, veio à tona e nos revelou seu mais profundo mistério. Estava perplexo.

III

Na segunda-feira, já a tardezinha. Os três rapazes: eu, Carlos e Hélio, reunimos em frente à casa da dona Carmem, mãe de Hélio. Silenciosos. Hélio sentava na velha cadeira de balanço antes pertencida à avó, encostada na parede de entrada da casa. Carlos debruçava-se sobre a rede atada estrategicamente para um maior conforto. E eu de pé encostava-me na enorme castanheira anciã em frente a casa. Fumava um cigarro de palha embolado por minhas próprias mãos, a fumaça invadia a casa e deixava os dois irritados.

- Acho que devemos contar. – Carlos quebrou o silêncio influenciado pela fumaça do meu cigarro.

- Mas ele nos confiou seu segredo. Somos seus amigos. Confia em nós. – Hélio prontamente discordava das palavras de Carlos, entretanto mostrava-se apreensivo.

- Também não conto. Não é justo. – Concordei.

A conversa não se prolongara muito. Cada um tinha uma opinião. Não havia nada a ser dito, não entre nós. Mas Carlos não concordava em manter segredo, quebraria o voto de silencio, revelaria a verdade por trás do doutor Black. Não nos disse que realmente faria, mas sabíamos, líamos seu olhar, sua expressão. Dispersamos. Cada um para sua casa. Menos eu. Segui para casa do doutor, tinha que lhe falar sobre Carlos, Sentia uma estranha sensação de lealdade. Devoção.

Chegando ao velho casarão aquela noite, onde Black fixara sua residência, percebi as portas e janelas trancadas. Ele não estava. Era estranho, pois as segundas ele não saia para atender na casa a menos que fosse um caso urgente, se este era o evento então ele não demoraria. Esperei. Dez da noite, ainda esperava. Meia noite, ele não retornou. Voltei para casa. Na manha seguinte, cedo, estaria na porta de sua casa. Devia lhe contar sobre Carlos e o segredo.

Sonhos estranhos me acometeram enquanto dormia. Carlos vinha até mim no sonho e dizia-me para revelar o segredo. Vestia-se de roupas finas, terno e gravata como nunca se vestira antes, sua expressão era aterrorizante, parecia muito pálido e com olhos fundos, como se dormisse há dias, das suas mãos pingavam sangue e vi passear por elas vermes, daqueles encontrados em comida estragada e animais mortos, comiam a carne de suas mãos. Parecia um morto.